;Nenhum mentiroso tem uma memória suficientemente boa para ser um mentiroso de êxito. A calúnia é a arma dos invejosos. O homem tropeça por vezes na verdade - Parte das vezes, recompõe-se e segue o seu caminho de Mentiroso - Disse Churchill sobre o homem. A estatistica é como o Biquini : O que mostra é Sugestivo - O que Esconde é Vital - - A Principal Causa dos Problemas - São as Soluções..... Hà 2 tipos de Raças de Porcos - O que não "cola" e o que não "descola".
quarta-feira, dezembro 08, 2010
06DEZ2010 - 321º Dia - Chegada ao Mar Mediterrâneo!
06DEZ2010 - 321º Dia - Chegada ao Mar Mediterrâneo!
Continuámos a subir o Mar Vermelho, à vela durante o dia, quando o vento soprava forte de ENE junto à costa da Arábia Saudita. À noite prosseguíamos a motor. No dia 28 de madrugada passámos ao largo do Porto de Jidah e de Meca, que fica cerca de 70 km para o interior deste porto principal da Arábia Saudita. Dia 30, estando muito adiantados e sem conseguir antecipar a passagem do Canal do Suez, resolvemos parar junto às Ilhas Irmãs (El Akhawein). São dois pequenos ilhéus com algumas centenas de metros de diâmetro e com um farol no maior. Junto deles estavam vários iates em cruzeiros de mergulho. Pairámos à vista até cerca da meia-noite, seguindo depois a motor para a zona de Sharm El Sheikh, no extremo sul da península do Sinai, com a entrada do Golfo do Suez por oeste e a entrada do Golfo de Aqaba por leste. O Golfo do Suez, com 180 milhas de comprimento, é circundado por território egípcio. O Golfo de Aqaba, com 90 milhas, é circundado pelo Egipto a oeste, por Israel e a Jordânia a norte e pela Arábia Saudita a leste.
Por aqui os dias são quentes e, por vezes muito ventosos. A água do mar estava quente e, a 28 e 29, enquanto pairávamos à tarde, já sem vento, arriámos o portaló, colocámos a embarcação na água, montámos vigilância especial e decretámos a natação de mar como actividade desportiva do dia. 28ºC, muito salgada! Mesmo muito salgada! Tínhamos maior flutuabilidade mas sentia-se um forte ardor nos olhos.
Mas o sal em excesso estava a dificultar a reposição das nossas reservas de água doce porque o dessalinizador estava a produzir a menos de metade da sua capacidade e fomos obrigados a voltar ao regime de água fechada limitando os banhos e as limpezas ao essencial.
As noites continuam a ser espectaculares. O nascer e pôr-do-sol são únicos. Observámos diversas vezes o raio verde ao anoitecer e, na manhã de dia 2, estivemos muito atentos ao nascer e sim, também é possível observar o raio verde nesta altura - é o primeiro, quando as condições são favoráveis. Não admira que os povos árabes fossem os melhores em astronomia na idade média. O céu daqui é fácil de estudar porque é limpo e não tem nuvens a ocultar parte das estrelas, permitindo observar sempre as suas posições relativas e, com método, determinar as regras com que se rege o seu movimento.
O crepúsculo matutino de dia um foi um desses perfeitos e resolvemos pegar no sextante para fazer um ponto astronómico - determinar a nossa posição através dos astros. O instrumento não saia da caixa desde que os cadetes desembarcaram, em Xangai. Observámos alturas de 9 astros: Lua, Vénus, Saturno, Polar, Spica, Dubhe, Sirius, Betelgeuse e Capella. Calculámos o ponto com o software do nosso PDA mas estavtão perfeito e como tínhamos a manhã de folga devido ao feriado, calculámos também pelos métodos tradicionais, i.e., com o Almanaque Náutico e com as tabelas HO229. Foram cerca de duas horas a tirar dados do almanaque, fazer continhas, entrar nas tabelas e tirar dados, fazer continhas, e depois desenhar o gráfico do ponto. O erro foi de apenas 1,3 milhas! Muito bom!
Passámos o feriado de 1 de Dezembro e a manhã de dia 2 a pairar junto a Sharm El Sheikh, depois iniciámos a navegação em direcção à entrada do Canal do Suez com o objectivo de aí fundear na manhã do dia 3. O nosso navio é muito especial o que faz com que não cumpra algumas das Regras do Canal, tais como a visibilidade para vante, o projector de luz especifico do canal, a velocidade, grua de 1,5 toneladas, embarcação rígida para amarração, etc., pelo que teria que ser inspeccionado e nele instalados os equipamentos necessários. E tencionávamos faze-lo fundeados enquanto aproveitávamos para envernizar as rodas do leme.
Na madrugada de dia 3, quando estávamos a chegar à zona onde era suposto fundear para realizar as inspecções, disseram-nos que não o iríamos fazer, não estando autorizados a largar ferro. Primeiro pairámos junto ao canal mas também nos disseram que não podíamos ali ficar e que teríamos que regressar em direcção ao Mar Vermelho - 1º contratempo do canal dos contratempos! O Golfo do Suez está totalmente demarcado com um Esquema de Separação de Tráfego pelo que as regras são muito restritas. Regressámos o mais lentamente possível para sul e, a meio da manhã, fomos contactados via rádio a informarem-nos que já podíamos ir fundear. Voltámos para norte e, ao chegar ao mesmo local onde estivéramos antes, nova indicação para regressar para sul... - 2º contratempo!
Tínhamos planeado tirar uma foto geral da guarnição nessa tarde e quando chegou a "hora dos fotógrafos", aquela hora em que a luz é mais propícia para fotos, parámos o navio e tratámos da nossa foto com toda a guarnição. Foi a despedida da farda branca de Verão pois daqui para a frente utilizaremos o uniforme de Inverno. O Verão está mesmo a acabar para nós e a olhos vistos porque em apenas uma semana baixámos 10ºC nas temperaturas do ar e da água do mar!
Às 04:30 da manhã de Sábado, dia 4, lá estávamos finalmente junto ao acesso do Canal. Afinal estávamos dispensados de inspecções. Embarcámos um piloto que nos levou através do Porto do Suez até à entrada do Canal. Tinha um questionário a que respondemos e ia-se queixando da visibilidade para vante, do radar ser no interior e o leme no exterior, da velocidade não chegar aos 10 nós, etc. Depois perguntou se tínhamos prendas para o piloto e tudo se resolveu com um boné, uma camisola e dois maços de tabaco. Não arriscámos oferecer uma garrafa de vinho português, como habitualmente fazemos, por serem muçulmanos. Ainda tivemos alguma dificuldade em reter a bordo o casaco que lhe tínhamos emprestado devido ao frio que estava.
20 minutos depois entra o piloto do Canal e sai o do Porto. Este bem mais polido e simpático. Logo a seguir chega o pessoal da manobra de cabos que não estava previsto porque como não temos uma grua suficiente, assim deveriam ir num rebocador, que não existiu, a acompanhar os navios para o caso de ser necessário atracar à margem nalguma situação de emergência. Depois dois electricistas que supostamente traziam o necessário projector (só tivemos 30 minutos de noite logo no início da passagem). Tinham várias malas e sacos mas o projector não apareceu. Aos primeiros alvores abriram os sacos no poço e começaram a montar um autentico bazar. Podiam-se comprar papiros, imagens da esfinge, lâmpadas mágicas, telemóveis, canas de pesca, etc.. Foi hilariante terem-nos pedido, logo à entrada, iluminação para a tenda, mas há limites para tudo, esperaram pela luz natural. Acabaram por ter azar com o negócio, pois como nós vamos para Alexandria, não faz sentido comprar-lhes ali as nossas lembranças sem primeiro ver a oferta da cidade.
O canal tem 162 Km de comprimento desde o Mar Mediterrâneo, junto a Port Said, até ao Golfo do Suez. Aproveitando a existência de três lagos, mais ou menos alinhados, o Timsah e os Pequeno e Grande Amargos, foram rasgados canais com cerca de 200 m de largura útil ligando os lagos entre si e aos mares que unem. A profundidade tem vindo a ser aumentada com o trabalho permanente das dragas e é actualmente de 25 metros sendo permitidos navios até 20 metros de calado.
Éramos o terceiro de um comboio de 24 navios encabeçado pelo HMS Montrose (Marinha Inglesa) e o ITS Libeccio (Marinha Italiana) que regressavam da área de operações anti-pirataria. Cruzámo-nos com um comboio de 17 navios que vinham para sul com a particularidade de entre eles navegar o MSC Irene, um dos maiores porta-contentores do Mundo, com 365 m de comprimento, 51 de boca e capacidade para 14000 contentores. Um colosso com mais de 300 000 toneladas. O cruzamento faz-se nos lagos e os navios provenientes de norte fundeiam e, quando tiverem libertado o canal norte, os de sul prosseguem. No final dos cruzamentos, em El Ismaillya, trocamos de pilotos. O nosso simpático piloto é rendido por outros dois - porque o navio tem pouca visibilidade para vante. Mas passaram o tempo todo dentro da ponte a conversar e, a certa altura, à vez, descalçaram-se e ajoelharam-se voltados para a alheta de estibordo, na direcção de Meca, para rezarem uma das suas cinco orações diárias.
Às 15:30 passámos sob uma enorme ponte em Al Qantarah, a penúltima desta viagem, a última é especial. A próxima será na nossa Alcântara que significa ponte pequena. Um dos pilotos, ao saber que íamos para Alexandria, a sua cidade, ofereceu-se para nos indicar os locais a visitar: dois centros comerciais, o Carrefour e o do Hotel Four Seasons, dança do ventre nos hotéis Sheraton ou Blasa, Biblioteca de Alexandria, Souk, Cidade Velha, Palácio Al Montasa, etc.
Ao longo das margens há vários postos militares de vigilância e alguns conjuntos de batelões pré preparados para estabelecer pontes militares entre as margens. Há grandes dunas de areia que foram construídas para servir de protecção aos bombardeamentos de cada lado durante a guerra com Israel que fechou o Canal em 1967 só abrindo em 1975. Durante o tempo em que esteve fechado, o transporte marítimo fazia-se pela Rota do Cabo e, por serem mais rentáveis, construíram-se super-petroleiros. Este foi o período áureo da nossa Lisnave por ser dos poucos estaleiros que tinham dimensão para os construir e reparar.
Findo o Canal, cerca das 18:00, reduzimos a velocidade para poupar o nosso motor que vinha bem acelerado para cumprir com a velocidade exigida ao comboio. Seguimos para oeste ao longo das rotas recomendadas e fomos pairar todo o dia 4 junto à foz mais a oeste do Rio Nilo que se bifurca no Cairo e desemboca no Mediterrâneo separado de cerca de 130 km. Ao longe estava a cidade de Rosetta onde um soldado francês encontrou, em 1799, uma pedra de granito com pouco mais de 1,1 x 0,7 x 0,3 m que fazia parte de uma muralha. A pedra de Rosetta veio revolucionar todos os estudos sobre o Egipto porque permitiu decifrar a escrita de hieróglifos. Tratava-se de um Decreto de Ptolomeu V, gravado em 196 aC em Menfis, escrito em três línguas: egípcio antigo, egípcio tardio e grego antigo. Foi a comparação entre as línguas permitiu decifrar os hieróglifos. Em 1801 os ingleses derrotam os franceses e a pedra viaja para Londres onde é uma das coqueluches do Museu Britânico.
Aproveitámos este último dia para finalizar os trabalhos de preparação do navio para o porto, que incluíam mais uma demão de verniz nas rodas do leme. À tarde, desafiámos o nosso adversário de estimação para uma regata de baleeiras à vela. Desafio aceite, aparelhámos as embarcações, cada um com os seus segredos e truques e com uma criteriosa escolha de tripulações. O vento soprava bem. Cerca de 15 nós e com ondas que chegavam aos 2 metros - radical. As baleeiras metem alguma água por terem a madeira muito seca e por serem de 1964 mas havia verdades a recuperar. A baleeira de estibordo metia mais água do que a nossa e de lá veio a declaração de desistência. Acabámos por ir fazer uns bordos sem adversário. São embarcações espectaculares e, com um bom vento, manobram-se muito bem e dão aquele gozo de navegar à vela sem ruído.
Prosseguimos viagem à meia-noite contra um vento que já atingia os 30 nós e ondas de 4 metros de proa. A fazer apenas 4 nós, contornámos a cabeça de areia que faz a foz do rio e ganhámos velocidade. Depois de uma dura noite de mar e vento, fizemos a aproximação final a Alexandria e, não havendo condições para o embarque de piloto, entrámos sem este até ao porto interior, mas essa história já faz parte da nossa próxima crónica.
Como não podíamos chegar ao Egipto e aproveitar minimamente a estadia, fizemos um pequeno estudo da sua história, que não é só feita de Faraós, e fomos falando com os pilotos com quem estivemos longas horas para tentar ir simplificando e resumindo o manancial histórico desta riquíssima civilização. É possível que hajam faltas ou incorrecções mas o importante é que fique a ideia geral da sua história:
A história do Egipto começa a formar-se na pré-história, quando se deu a desertificação da região do Sahara e as populações das áreas afectadas se concentraram no fértil vale do rio Nilo. O território foi governado por dinastias de Faraós até 525 aC, altura a partir da qual sofreu uma sucessão de invasões estrangeiras. Os Faraós eram considerados reencarnações vivas do Deus Hórus e viviam principescamente com as suas Cortes. Tinham um sistema de cobrança de impostos muito desenvolvido e ambiciosos projectos de construção de pirâmides que eram um símbolo de poder divino e que desenvolveram muito várias artes e tecnologias. Estava sob o domínio do império Persa quando, em 332 aC, Alexandre Magno o invadiu, sendo recebido como um libertador e ficando o Egipto ligado às civilizações helénicas do Mediterrâneo por treze séculos. Alexandre o Grande fundou Alexandria que ficou capital do país. Quando morre, em 323 aC, não havendo sucessão definida, gera-se uma disputa entre os seus generais de que resulta, em 305 aC, a coroação do General Ptolomeu, então Governador do Egipto, que inicia a dinastia ptolemaica que governaria o país até ao ano 32 aC quando, governado pela famosa Rainha Cleópatra não resistiu às invasões romanas, apesar de esta ainda ter feito algumas alianças com estes.
Governado pelos romanos, o Cristianismo já estava instalado no Sec. III. Em 642, três anos após a morte de Maomé, os muçulmanos ocupam o Egipto e instalam a sua capital em Al Futsat, localidade onde se situava uma fortaleza romana chamada Babilónia. A capital passou posteriormente a chamar-se Cairo. A população foi-se convertendo ao Islamismo e adoptando a língua árabe devido ao governo e aos povos árabes que se lhes foram juntando.
No sec. XVIII vivia-se um período de penúria e fome e o país estava vulnerável, o que alimentou os interesses de ingleses e franceses. Em 1798 foi invadido pelas tropas napoleónicas que retiraram três anos depois perante os ingleses em aliança com os turcos. O Francês Ferdinand Marie, Visconde de Lesseps, convence franceses e egípcios a construir o canal do Suez, construído entre 1859 e 1869, ficando propriedade dos dois países. Em 1875, o país estava próximo da bancarrota e os ingleses compraram a sua parte da Companhia do Canal do Suez. Após a revolta árabe de 1879-1882, os ingleses ocuparam o país e governaram-no por 40 anos até que em 1922 se tornou um reino independente embora sob um certo domínio de Inglaterra que continuava a defender os seus interesses. Em 1952, o Rei Farouk foi deposto através de um golpe de estado militar, passando a ser uma república independente sob a presidência do Presidente Nasser que nacionaliza o Canal do Suez em 1956 dando origem a uma guerra contra ingleses, franceses e israelitas que retiraram forçados pela ONU e EUA. Em 1967 Israel ocupa a península do Sinai (margem leste do canal) e o canal é fechado. Em 1970 morre Nasser e sobe ao poder Anwar Sadat que recupera o Sinai em 1973, reabre o canal em 1974 e assina um tratado de paz com Israel em 1979. Fruto da sua aproximação aos EUA e Israel, é assassinado em 1981 por um extremista muçulmano sendo substituído por Hosni Mubarak, seu vice-presidente, que foi sendo eleito e reeleito até agora e parece que assim continuará a ser pelos resultados das eleições realizadas há poucos dias.
Falta-nos focar um aspecto que tem mexido muito com os nossos amigos: A chegada a Lisboa!
Este navio é um veleiro com um motor auxiliar e a sua progressão depende muito do vento e do mar. Os cálculos que nos asseguram 95% de probabilidade de cumprir apontam para dia 23 às 15:00 e têm em conta os ventos, o mar e as correntes que podem ocorrer nesta época do ano. Pela nossa parte, cada dia que podermos antecipar será muito apreciado em virtude da proximidade do Natal e da saudade, termo que nós, marinheiros portugueses, inventámos. Estamos em Dezembro, mas se o vento e o mar o permitirem e se pudermos ajustar a nossa chegada ao protocolo e cerimonial que naturalmente lhe estão associados, então chegaremos mais cedo. Em concreto só poderemos ter dados mais precisos com cerca de 5 ou 6 dias de antecedência.
Estamos em pulgas como se poderá imaginar mas o importante é terminar em beleza uma viagem que nos custou tanto a nós e aos nossos familiares e amigos, e que não deixou de constituir um grande investimento da Marinha.
Depois contaremos!
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