terça-feira, junho 04, 2013

O Freeport? serviu para treino



O anterior procurador-geral da República deu uma entrevista de duas páginas ao Expresso. Uma parte dessa entrevista é dedicada ao processo Freeport, em relação ao qual os jornalistas vão descobrindo sucessivos novos ângulos para fazer as mesmas perguntas de sempre — o que acaba por tornar mais ricas as respostas de Pinto Monteiro.

Depois de centenas de manchetes nos jornais sobre o caso Freeport, o anterior procurador-geral da República dá uma cacha ao Expresso: “o processo Freeport é uma fraude”. Não seria natural que o semanário puxasse para a primeira página esta afirmação? Seria, mas não acontece, vá lá saber-se porquê.

Aqui fica a parte da entrevista relativa ao caso Freeport:
    Como é que ficou a sua relação de amizade com a diretora do DCIAP, Cândida Almeida? A dra. Cândida Almeida continua a ser minha amiga. Agora... funcionalmente discordei dela. E fiz o que a lei me impunha.

    Foi por isso que, a propósito do ‘processo Freeport’, lhe instaurou um processo disciplinar?
    Sim. O CSMP entendeu arquivá-lo. Há o dever de lealdade de informação. Se eu sempre disse para investigarem até ao fim... No último dia do prazo, às sete da tarde, puseram-me o processo em cima da secretária. Estava cheio de coisas para fazer e não tive tempo para o ler na altura. Tive a surpresa, no dia seguinte, de o jornal “Público” trazer as perguntas que não chegaram a ser feitas a José Sócrates. Se entendiam que havia perguntas a fazer, deviam ter pedido mais tempo. Ou então as perguntas não tinham razão de ser.

    Porque é que isso aconteceu? 
    Aconteceu e foi errado. Com os anos que o processo durou, não houve tempo para fazer as perguntas? Por amor de Deus. Se as quisessem fazer, tinham-nas feito. O mal está em que não se pode terminar um processo deixando uma suspeição no ar, porque a imprensa imediatamente aproveita isso. Em dezenas de milhares de processos, nunca tinha visto uma coisa assim.

    O ‘processo Freeport’, pelos vistos, está cheio de coisas que nunca viu.
    Por isso é que é um processo político.

    Como é que isso se explica? 
    Não faço ideia nenhuma. Tem de perguntar aos próprios. E aquelas perguntas adiantavam alguma coisa? Viram o que a dra. Cândida disse, que as perguntas eram completamente inúteis? Repare que o processo voltou agora aos magistrados e eles mandaram-no arquivar.

    Mas porque é que José Sócrates nunca foi ouvido como testemunha? 
    Nunca arranjaram elementos que metessem o homem em parte nenhuma.

    Mas o tribunal que fez o julgamento não concordou com a conclusão do MP. 
    Fui juiz toda a vida e nunca vi um julgamento sobre o António e o João, com o tribunal à procura de provas sobre uma pessoa que não está lá, mas enfim. Esse despacho foi enviado para o DCIAP e os procuradores analisaram tudo outra vez e concluíram pelo arquivamento. Está arquivado.

    Com outro cidadão e com os mesmos indícios, o processo teria tido o mesmo desfecho?
    Mas o processo não tem indícios nenhuns. Tem uma carta anónima e uma senhora que ouviu uma conversa no café. Se fosse com outro cidadão, o processo teria sido arquivado liminarmente. Se eu mandasse investigar todas as participações que recebi, poucos políticos não estariam agora com um processo-crime. Mal de nós se formos condenar alguém por ouvir dizer. O ‘processo Freeport’ foi muito bem investigado e até foi o terceiro mais caro de sempre, depois de Camarate e da Maddie.

    Foi o tribunal a dizer que as suspeitas contra o antigo primeiro-ministro não foram bem investigadas pelo MP.
    Não comento decisões judiciais, mas o processo é uma fraude. O maior problema que o MP tem é a contaminação entre a Justiça e o poder político. E, mesmo que se apure que não há nada, fica sempre a suspeição. E o pior é que já há magistrados a fazer política.

    Como?
    Basta lê-los e ouvi-los.

    Os magistrados fazem política durante as próprias investigações? 
    Às vezes, sim. Nos comentários das decisões e nas observações políticas que são desajustadas do aspeto judicial dos processos.

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