O Governo minoritário de Sócrates e a "maioria negativa" que o 'derrubou'
Há quatro anos, José Sócrates venceu sem maioria as eleições legislativas e ao longo de quase dois anos foi obrigado a negociar e fazer cedências, com a oposição a conseguir impor medidas contra a vontade dos socialistas.
Quatro anos depois, e na véspera de a Assembleia
da República se reunir pela primeira vez para a XIII legislatura, ainda é
incerto se o país voltará a ter um Governo sem apoio parlamentar
maioritário.
Contudo, a verdade é que o executivo socialista chegou à Assembleia da República para discutir o seu programa sem acordos à esquerda ou à direita, dando o 'mote' para uma legislatura conturbada, onde os momentos de tensão parlamentar se foram sucedendo.
Precisamente dois meses depois das eleições, a 27 de novembro, acontecia a primeira 'vitória' da oposição parlamentar, que impôs a aprovação de 11 diplomas com medidas "anticrise" do PSD, CDS-PP e PCP, nomeadamente o adiamento para janeiro de 2011 da entrada em vigor do Condigo Contributo e a extinção do Pagamento Especial por Conta.
"Deslealdade", comentou o então primeiro-ministro, que considerou "absolutamente inacreditável" que nas primeiras semanas com o novo parlamento e ainda antes da discussão do Orçamento do Estado, os partidos da oposição tenham aprovado propostas que aumentavam a despesa em "mais de dois mil milhões de euros".
"Houve hoje uma completa indiferença em relação às condições de governabilidade. Não podem pedir ao Governo do PS que governe na base dos programas dos partidos que perderam as eleições", corroborou o então ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão, falando mesmo numa "maioria negativa".
Ao longo de 2010, as sexta-feiras - dia da semana em que tradicionalmente decorrem as votações na Assembleia da República - continuaram a ser agitadas, com a oposição a insistir no confronto às políticas seguidas pelo Governo de José Sócrates.
Por vezes, o próprio grupo parlamentar socialista surpreendia e juntava-se à maioria, como aconteceu em janeiro, quando o PS e o BE aprovaram a proposta dos CDS-PP para aumentar o subsídio de desemprego para casais desempregados, dias depois da então ministra do Trabalho, Helena André, ter recusado a medida, afirmando não existirem "razões objetivas" que a justificassem e que o Governo "não está convencido da racionalidade dessa medida".
O fim dos prémios dos gestores públicos no ano de 2010, a obrigação do Estado a pagar juros de mora quando se atrasar nos pagamentos aos fornecedores, alterações ao Estatuto do Aluno, foram outros dos diplomas da oposição aprovados.
A discussão sobre a introdução das portagens na SCUT esteve também em cima da mesa. Primeiro a oposição conseguiu aprovar na generalidade a revogação do sistema de identificação eletrónica de veículos, mas PS e PSD acabaram por chegar a acordo para alterar os decretos do Governo relativos ao pagamento das portagens nas SCUT.
Antes das férias parlamentares, o CDS-PP conseguiu ainda aprovar um projeto de lei para reduzir os vencimentos dos membros dos gabinetes do Governo, dos presidentes e vereadores de Câmaras Municipais, governadores civis e dos gabinetes da Assembleia da República.
Ao todo, na primeira sessão legislativa, os partidos da oposição conseguiram aprovar 13 apreciações parlamentares e 59 projetos de lei.
Nos seis meses que durou a segunda e última sessão legislativa da XVIII Legislatura, a oposição conseguiu ainda aprovar alguns diplomas, como a dispensa gratuita de medicamentos após alta de internamento pelos serviços farmacêuticos dos hospitais integrados no Serviço Nacional de Saúde ou a cessação de vigência do decreto-lei do Governo que introduzia alterações curriculares no ensino básico.
Acabaria por ser também um 'chumbo' da oposição que derrubou o Governo de José Sócrates, que após aprovação de projetos de resolução do PSD, CDS-PP, PCP, BE e Verdes de rejeição do chamado PEC 4 foi a Belém apresentar a demissão do cargo de primeiro-ministro.
Dois dias depois da demissão de José Sócrates, a oposição conseguiu ainda fazer passar a revogação da avaliação de desempenho dos professores. A medida, contudo, acabaria mais tarde por ser considerada inconstitucional pelos juízes do 'Palácio Ratton'.
Apesar da "maioria negativa" - como diversas vezes Jorge Lacão se referiu à oposição - o PS conseguiu encontrar apoio à sua esquerda para a aprovação de uma das suas 'bandeiras': a consagração legal do casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Sem comentários:
Enviar um comentário