segunda-feira, fevereiro 27, 2017

Documentos secretos da CIA podem agora ser lidos no seu computador

A estatistica é como o Biquini :- o que mostra é sugestivo :- o que esconde é vital


O presidente português Costa Gomes (à esq.,
 de frente) recebido pelo presidente americano Gerald
 Ford, em dezembro de 1974: EUA acompanharam de

 perto a Revolução do 25 de Abril


Agência americana disponibilizou milhares de ficheiros na
 internet. E há muito para ler da história recente de Portugal
Não há segredos nos milhares de documentos que a CIA
 colocou na internet ao alcance de todos, mas no mar 
de textos disponibilizados podem ainda encontrar-se surpresas. 
Portugal, o 25 de Abril, os anos quentes que se seguiram
 e os protagonistas das décadas de 1970 e 1980 estão
 abundantemente retratados nestes documentos.
Disponibilizados em janeiro (que podem ser vistos no endereço
 https://www.cia.gov/library/readingroom/), estes ficheiros antes 
só estavam acessíveis a quem fosse aos Estados Unidos, 
como recordou ao DN o jornalista Nuno Simas, autor
 de Portugal Classificado - Documentos Secretos Norte-Americanos
 (1974-1975), editado pela Alêtheia Editores.
"São milhares de documentos e tínhamos de ir aos EUA
 para os consultar. Agora estão à distância de um clique e 
permitem fazer download", explicou Simas, sublinhando a
 importância desta decisão da agência americana. E que
 abre "um mar" de páginas e páginas à espera de serem 
navegadas - são 800 mil documentos, 13 milhões de páginas,
 entre memorandos, relatórios, recortes de jornais. "É preciso refinar
 a pesquisa", advertiu o jornalista.
A pesquisa por Portugal devolve-nos 8215 resultados. Entre
 estes está o "memorando" que Henry A. Kissinger, com 
o selo da Casa Branca, em que o então secretário de Estado
 americano dava conta do "coup in Portugal" - o golpe era o
 do 25 de Abril e já estava nas ruas há quatro dias, quando o
 governante da administração de Gerald Ford aponta a 
principal causa para "o golpe praticamente sem derramamento
 de sangue" como sendo as "políticas de Lisboa para África 
e as divisões entre os militares".
Mais à frente, Kissinger apontava que os militares "insurrectos", "
soberbamente organizados e bem conduzidos", "tomaram 
o poder de surpresa". E numa nota de alívio o governante 
sublinhava que, até aquele momento, "o novo governo
 parece ter o controlo completo". Nuno Simas notou que
 os americanos não estiveram "muito longe" na parte de 
África, "foram mais corretos", do que "na avaliação interna
" e na perceção do "poder que cada um tinha". "Houve
 um erro de cálculo. Foram um bocadinho ao lado. Acharam que
 podiam ter Spínola como aliado", exemplificou.
Irão-Contras em Lisboa
Sem antecipar grandes revelações, há coisas que ainda
 merecem um olhar atento na pesquisa de filigrana que
 é necessário fazer. Por exemplo, no caso do Irão-Contras, 
um escândalo que abalaria nos anos 1980 a administração 
Reagan, por financiamento dos Contras nicaraguenses, 
quebrando um embargo de armas ao Irão. "Uma das primeiras
 notícias", agora disponibilizada pela CIA, "aponta logo para
 voos com passagem por Lisboa", anotou Simas. "Até que ponto
 Portugal sabia desta operação", questionou-se o jornalista.
Estes ficheiros foram considerados como "não confidenciais"
 já nos anos 1990 e então disponibilizados ao público, mas a 
desclassificação foi parcial - no referido memorando sobre o 
25 de Abril está lá a indicação: "Sem objeção para
 desclassificação em parte."
A sua consulta era difícil, mesmo para americanos. Os documentos só
 podiam ser vistos e lidos num departamento da CIA, a partir de 
quatro computadores do edifício dos Arquivos Nacionais, em 
College Park, no estado do Maryland, mas a pressão de jornalistas,
 investigadores e da Muckrock - organização não governamental 
que processou a agência em 2014 para poder ter acesso a estes 
ficheiros - resultou nesta divulgação em massa.
"O acesso a esta importante coleção histórica já não está limitado
 pela localização geográfica", admitiu Joseph Lambert, diretor da
 gestão de informações da CIA, segundo um comunicado citado 
pela CNN. Nenhum dos documentos disponibilizados nesta base 
de dados Crest (CIA Records Search Tool - em português, ferramenta 
de pesquisa dos registos da CIA) deixou de ser secreto recentemente.
A leitura dos analistas da CIA e do Departamento do Estado 
americano era muito feita a partir de "como é que isso afeta os 
interesses dos americanos", registou Nuno Simas, como por 
exemplo numa "análise circunstanciada às eleições de 1986",
 em que Mário Soares é eleito presidente da República, com o apoio 
do PCP na segunda volta. Segundo a agência Lusa, a CIA alertou,
 nesse ano, que a vitória de Mário Soares nas eleições presidenciais
 não apagava os riscos de instabilidade política em Portugal, e 
antecipava um conflito, no futuro, com o seu "inimigo político"
 Cavaco Silva. Pelos vistos, aqui acertaram.

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