sábado, fevereiro 06, 2016

Galeria | Clube Naval de LisboaMudou a ordem para andar na rotunda do Marquês de Pombal, os carros mais antigos foram afastados, foram criadas ciclovias. Mas o objetivo saiu furado: a avenida está mais poluída
Houve obras, proibições de circulação de veículos mais poluentes e alterações no trânsito - tudo para melhorar a qualidade do ar no eixo da Avenida da Liberdade, em Lisboa. Mas as medidas não estão a ter a eficácia desejada. Afinal, o número de viaturas que circulam na Avenida da Liberdade aumentou 30% de 2014 para 2015. O "aumento brutal" surpreendeu a equipa que tem monitorizado estas zonas de emissões reduzidas (ZER) de Lisboa, instituídas em 2011 e que, na prática, se assumem como áreas da cidade onde os carros mais antigos não podem circular. Um crescimento, reconhece o coordenador do grupo da Universidade Nova de Lisboa, Francisco Ferreira, que põe em causa tudo o que ali tem sido feito para melhorar a qualidade do ar.
Até 2014, a capital estava já a conseguir cumprir a exigência de não exceder mais do que 35 vezes por ano o limite máximo de partículas permitido; no ano passado, os dados provisórios apontam para que este tenha sido ultrapassado 68 vezes. A evolução ressuscitou o debate em torno de um encerramento da Baixa ao trânsito por questões ambientais.
O processo iniciou-se em 2011, quando o executivo então liderado por António Costa aprovou a criação da ZER - uma medida que fora já acordada com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) de Lisboa e Vale do Tejo. A primeira fase entrou em vigor em julho de 2011 e consistiu na proibição de veículos anteriores a 1992 sem catalisador circularem no eixo Avenida da Liberdade-Baixa, delimitado a norte pela Rua Alexandre Herculano e a sul pelo Terreiro do Paço (zona 1).
Em abril de 2012, este eixo passou a estar interdito a viaturas fabricadas antes de 1996, ao mesmo tempo que a restrição anterior passou a abranger a área da cidade a sul da Avenida de Ceuta, eixo Norte-Sul, Avenida das Forças Armadas, Avenida dos Estados Unidos da América, Avenida Marechal António Spínola e Avenida D. Henrique (zona 2). A partir de janeiro do ano passado, com a entrada em vigor da terceira fase da ZER, os carros anteriores a 2000 deixaram de poder circular na zona 1 e os anteriores a 1996 na zona 2. Os veículos de moradores e os de emergência são alguns dos casos com isenção.
Paralelamente, foram ainda implementadas, em setembro de 2012, alterações ao trânsito no Marquês de Pombal e na Avenida da Liberdade (ver fotolegenda). A condicionar todo o processo, desde o início bastante controverso, esteve a condenação de que o Estado português foi alvo pelo Tribunal Europeu de Justiça devido aos elevados níveis de poluição na Avenida da Liberdade e que, se nada fosse feito, se traduziria no pagamento de uma multa de 1,9 milhões de euros a que acresceriam 630 euros/dia até se cumprir os valores legais de poluição.
Câmara admite dificuldades
Só que, em 2015, o aumento de tráfego de 30% na Avenida da Liberdade - o DN solicitou, sem sucesso, o número concreto de veículos à autarquia - veio pôr em causa todo o progresso alcançado. "Estragou todos os modelos que tínhamos elaborado e que tinham sido feitos a contar que o tráfego se manteria", desabafa Francisco Ferreira, ressalvando que uma situação meteorológica desfavorável em 2015 e a ausência de fiscalização podem ter também contribuído para que o limite máximo diário de emissões de partículas tenha sido, para já, ultrapassado 68 vezes no ano passado. A concentração de dióxido de azoto, que nunca chegara a situar-se no intervalo legal, terá subido.
"É um facto que, neste momento, por o município não ter qualquer poder de intervenção junto da PSP, há uma situação de dificuldade de controlo", admitiu, na reunião pública do executivo de 27 de janeiro, o vereador do Urbanismo, adiantando que, atualmente, o controlo é "pontual" e "feito através da Polícia Municipal", entidade que, em janeiro, afirmou não dispor de dados quanto ao número de veículos multados por violação da ZER. Manuel Salgado ressalvou que "o mais grave" é não este incumprimento mas sim o aumento do número de veículos a entrar em Lisboa.
"É uma questão que tem que ver com a sustentabilidade da cidade, com o sistema de transportes a nível metropolitano e que é um desafio que se coloca, efetivamente, a este município. Temos de pensar como intervir relativamente a este facto e como conseguir reduzir o número de veículos que entram em Lisboa e fazer a transferência modal do transporte individual para o transporte público", considerou, adiantando que há múltiplas ideias - como fechar a Baixa à circulação de ligeiros ou instalar portagens à entrada da cidade - que têm de ser discutidas de forma "séria" e "ponderada". Francisco Ferreira não acredita que se consiga encerrar totalmente a Avenida da Liberdade, mas defende que sejam tomadas medidas intermédias.

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